Tributo: "Amor Cão"
No currículo de Alejandro González Iñarritu constavam apenas uma curta-metragem e um telefilme quando explodiu para o Mundo com "Amor Cão" ("Amores Perros"), em 2000. Este filme definiu um estilo pessoal para as obras seguintes, inspirou cineastas e argumentistas norte-americanos e despertou o interesse por uma certa geração de realizadores mexicanos, que inclui Guillermo Del Toro e Alfonso Cuáron, dois conterrâneos a jogar na mesma divisão. No entanto, nenhum destes é capaz de captar a crueza da realidade com tamanha objectividade.
"Amor Cão" é um cruzamento de histórias, com início num acidente de viação e onde, aparentemente, o único ponto comum é o amor exarcebado por canídeos. Um rapaz sem condições financeiras coloca o seu pitbull a render em lutas clandestinas, para ajudar a sustentar o sobrinho e poder fugir com a cunhada; uma manequim de sucesso, paralisada na sequência de um desastre, vê o seu caniche desaparecer sob o soalho da casa para onde se mudou com o amante e a relação a desabar entre a busca pelo cão e os dias depressivos em cadeiras de rodas; um sem-abrigo misterioso, antigo assassino a soldo, vive rodeado por uma matilha de cães até entender que a vida não faz sentido distante da filha.
É na solidez com que cruza estes três "plots" que Iñarritu se revelou não só como uma excelente realizador, como um brilhante contador de histórias. O anacronismo em que estas se alinham - só mais tarde se entende a relação entre elas -, é essencial para manter o espectador na expectativa de compreender uma associação nunca evidente nos primeiros minutos. Admito que as minhas sequências favoritas são as que envolvem a modelo, e o seu desespero pelo cão que se enfia por tempo indeterminado pelo chão. É no retrato da futilidade daquela mulher, do seu contexto e das suas efémeras aspirações - uma crítica social também presente nos restantes segmentos - que o realizador demonstra a sua versatilidade em abordar diferentes ambientes, uma espécie de tubo de ensaio para o seu magistral "Babel". Algo que o argumentista e realizador sobrevalorizado Paul Haggis jamais conseguiu atingir com o seu "Crash: Colisão", tão óbvio e descarado que chega a ser constrangedor (não sei se repararam, mas não há personagem que nos primeiros 20 minutos não profira um comentário racista, não vá o espectador alienar-se do assunto do filme).
É também em "Amor Cão" que Iñarritu dá oportunidade a Adriana Barraza, actriz injustiçada na última cerimónia dos Óscares. E é em "Amor Cão" que este Robert Altman dos nossos dias, soberbo na montagem e na diversidade, prova que há mais e bom cinema para além do país que lhe faz fronteira. 5 estrelitas
2 comments:
o melhor filme sul-americano que já vi....ok...há outro Cidade de Deus...para mim ficam empatados os dois...
abraço
Embora incomparáveis, acho que estão ao mesmo nível. Mas, em termos de originalidade de argumento, o "Amor Cão" levava a bicicleta! Grande abraço, Luís.
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