"Eu Sou a Lenda": a crítica
A entrega de Will Smith e uma realização no fio da navalha são os principais predicados de "Eu Sou a Lenda". No entanto, este thriller de ficção científica apocalíptico e submerso numa tensão constante não deixa de ser unidimensional - muito diferente da mensagem da novela que lhe deu origem.
Em 2012, três anos depois de encontrada a suposta cura para o cancro, a Humanidade foi condenada pelo vírus primariamente apresentado como salvador. Homens, mulheres, crianças e animais são agora uma espécie de "vampirozombies" que se alimentam durante a noite. Todos, excepto um indivíduo, o cientista e militar Robert Neville e a sua cadela, Sam. Naquela existência solitária controlada pela luz do dia, o último homem na Terra tenta incessantemente descobrir o antídoto para o vírus.
"Eu Sou a Lenda" é uma adaptação demasiado livre do romance de Richard Matheson, desprendendo-se do conceito original. Em "The Omega Man", o filme da década de 70 em que Neville é Charlton Heston, a adaptação fiel conta a história de uma sociedade contaminada por um vírus, organizada e hierarquizada, que vê na personagem principal uma ameaça contra esta nova forma social. Ele é, portanto, o monstro. Em "Eu Sou a Lenda", os infectados são seres quase acéfalos (embora liderados) e não há qualquer indício ao longo da história de que estes encarem o cientista como um perigo para a sua existência. Perseguem-no guiados pelos seus instintos mais básicos, os de protecção da matilha e da alimentação. É certo que esta abordagem pode ser mais interessante cinematograficamente (até porque ainda recentemente, "A Invasão" tinha um argumento semelhante à novela "I am Legend") e permite criar um clima de tensão mais apurado e cenas de acção mais trepidantes.
Mesmo assim, ou não fosse esta uma história apocalíptica, residem aqui múltiplos ingredientes bíblicos: a perda de fé e o seu reencontro ou a dizimação para a renovação (o dilúvio), por exemplo. Neville, uma espécie de Noé sem arca, tem nas suas mãos o futuro da Humanidade.
Os efeitos CGI servem a história sem a sufocar, mas não se entende o recurso ao digital no que diz respeito aos Noctívagos quando obras recentes (lembro-me de "A Descida") utilizaram eficientemente actores e caracterização para interpretar monstros daquele tipo, imprimindo-lhe outro nível de realismo. O resultado são seres com movimentos demasiado velozes, tipo Homem-Aranha, subtraindo alguma credibilidade. O mesmo não sucede na composição de uma Nova Iorque em ruína. No que diz respeito ao protagonista, Will Smith está como o vinho do Porto e prova que é um dos melhores actores norte-americano da sua geração. Não é comum, num filme do género, uma personagem tão profunda, a oscilar entre a vulnerabilidade, a loucura e a coragem. 3 estrelitas
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