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A Face Oculta de Mr. Brooks" é um dos mais intrigantes e bem urdidos "thrillers" dos últimos anos. Esta história sobre um serial-killer empático e com um certo charme intelectual - Hannibal Lecter será o seu paradigma, Tom Ripley no mesmo nível - ganha por subentender mais do aquilo que mostra.
Uma coisa é certa: sai-se da sala de cinema com um turbilhão de questões e quanto mais tentamos juntar as pontas, mais nos atolamos no lodo. Será que é assim tão evidente que a filha de Earl Brooks herdou a sede de morte do seu pai? Terá ela assassinado o colega de liceu? A que imagem corresponde Marshall, o alter-ego de Brooks: será uma simples representação do seu pensamento ou do seu pai? Terá ele realmente parado dois anos, ou terá assassinado nesse hiato vestindo outras personagens ("matei de muitas outras formas", diz ele no final)? Terá ele apenas prazer no que faz ou sofre do distúrbio de personalide múltipla? Seja qual for a resposta, nada disto é comprovável: a história é contada através da mente tortuosa de Brooks e seja qual for o pensamento, nada nos garante que seja verdadeiro.
Como primeiro episódio de uma trilogia, é provável que muitas das dúvidas sejam desfeitas num próximo capítulo. Mas, até lá, o filme de Bruce A. Evans deixa-nos a matutar. E se para muita gente parece ser óbvio o que se mostra, a verdade é que a película deve ser analisada nas entrelinhas e assim como Brooks muda de direcção como quem despe uma camisa, também nós deveremos colocar em causa aquilo que nos é sugerido como tendo acontecido. Repito: praticamente tudo o que vemos é-nos dito por Earl Brooks e pelo seu demoníaco "grilo falante", Marshall.
Como em qualquer "thriller", há falhas. Os subplots que envolvem a personagem de Demi Moore, uma polícia com um trajecto pessoal identificável com o do "serial killer" que persegue, são por vezes inconsistentes, principalmente devido ao "casting" pobre do núcleo da actriz e ao tratamento desleixado das personagens. Por exemplo, o inescrupuloso assassino Meeks assemelha-se mais a um "inofensivo" delinquente de bairro do que ao monstro que nos impingem antes de o conhecermos. Por outro lado, embora as cenas de acção sejam exemplarmente montadas, sente-se alguma falta de atenção nos pormenores. Tal acontece na sequência de tiroteio num corredor às escuras em que as personagens estão literalmente frente a frente sem serem atingidas.
Com este filme, Kevin Costner parece ter renascido das cinzas. O actor imprime a contenção e o perfeccionismo necessários para a construção da sua personagem e é surpreendente a química com o sempre eficaz William Hurt, seu alter-ego. Marg Helgenberger é correcta no papel da esposa de fachada compreensiva, mas subaproveitada. Veremos se a mulher que dá brilho a CSI: Las Vegas "arranca" a sério na sequela.
3 estrelitas